Pedro Almeida fala sobre sua carreira, o crescente sucesso da Faro Editorial, bienal, o incidente com os livros LGBT e muito mais!
Com 26 anos de carreira no mercado editorial, Pedro Almeida é hoje um dos mais respeitados e prestigiados nomes do setor.
Pedro Almeida é jornalista profissional e professor de literatura, com curso de extensão em Marketing pela Universidade de Berkeley. É também autor de diversos livros. Atua no mercado editorial há 26 anos. Foi publisher em editoras como Ediouro, Novo Conceito, LeYa e Saraiva. E como editor associado para Arx, Caramelo e Planeta. Desde 2014 é professor de MBA Publishing e desde 2016 é membro do Conselho Curador do Prêmio Jabuti, inclusive, este ano, ele é o Curador do prêmio, em sua edição de número 61. Em 2013 iniciou uma nova etapa de sua carreira, lançando a própria editora: A Faro Editorial.
Evan Klug, nosso editor-chefe teve uma conversa muito bacana com o Pedro, que falou sobre sua carreira, suas lutas e o que espera para o mercado editorial brasileiro. Então, acompanhe a entrevista e conheça melhor, aquele que temos a grande honra de chamar de amigo, Pedro Almeida.
Evan – Oi Pedro, antes de falar da Bienal deste ano, gostaríamos que nos contasse um pouco sobre o início da Faro Editorial. Em 2013 você deixou a Lafonte para abrir sua própria editora, a Faro, digamos que não era um ano muito promissor ou otimista para o mercado editorial, mesmo assim você se lançou nesse projeto ambicioso, que é fundar uma editora. O que te levou a fazer isso e como foi o início da Faro Editorial?
Pedro – Sou editor há 26 anos e mais da metade da minha carreira estive em 3 editoras. Eu sempre alimentei o sonho de ter autonomia completa para publicar. Esse era meu sonho. Mas não foi um lance de impulso. 5 anos antes decidi começar a fazer as bases desse plano. Escolhi nomes para os selos, desenvolvi logo com designer e organizei uma lista de obras que gostaria de publicar. Eu não sabia quando iria colocar em prática, mas estaria preparado. Quando decidi sair da Lafonte, avisei à pessoas próximas e uma delas me colocou em contato com meu atual sócio. Este amigo sabia que Diego tinha o plano de abrir um negócio próprio. Eu havia trabalhado num período curto com ele na Lafonte, havia feito o teste-drive, então quando fomos conversar sobre a possibilidade eu tinha um conceito de que uma sociedade com ele poderia dar certo. A manchete da época, do anúncio de nossa editora que aconteceu no dia de abertura da Bienal do RJ de 2013 foi exatamente essa: jovens abrem editora em meio à crise… gostei mesmo por terem me chamado de jovem.
Evan – Já há algum tempo a Faro tem investido em novos talentos da literatura nacional. Pouquíssimas editoras têm feito isto efetivamente. Enquanto várias delas apostam apenas no óbvio que é trazer para seu catálogo best-sellers internacionais a Faro tem dosado as duas coisas de forma inteligente. Como vocês decidem o quanto se pode investir em cada segmento? Isso tem a ver com o momento do mercado também?
Pedro – No início da editora eu não sabia como iríamos fazer. Eu sabia apenas que não entraria em bolas divididas, em nichos muito disputados por grandes editoras. Assim, decidimos publicar autores nacionais novos, nas linhas que ainda não eram menina dos olhos das grandes editoras. O plano sempre foi de desenvolver autores para um momento futuro, quando estes gêneros seriam mais bem aceitos por grande parte dos leitores. Há dois tipos de editores, o que publica estrangeiros e o que edita nacionais. Eu sempre fiz os dois e tenho o maior prazer em editar nacionais. Comecei a editora com autores de não ficção que já me acompanham há bastante tempo, como Jacob Petry, então decidi investir no policial e terror nacionais e também no YA nacional, pois eram temas em ascensão no mercado internacional, mas aqui ainda não havia tanto investimento nos autores do país.
Evan – A Faro Editorial tem crescido exponencialmente e com poucos anos de vida já desponta entre as principais editoras do Brasil. Como você avalia o êxito desses primeiros anos e à que você atribui este sucesso?
Pedro – Uma empresa nova tem muitas vantagens. Mantivemos um plano enxuto em meio às dificuldades do setor. Todo mundo na editora aqui trabalha muito num tipo multitarefa. (Risos.) Atravessamos duas crises e nossa vantagem é que conseguimos prever as crises, tomar medidas rapidamente para reduzir seus danos, e reagir ativamente, para retomar o plano. Boa parte do nosso sucesso tem a ver com isso. Tomar decisões rapidamente; corrigir curso, rapidamente.
Evan – A Bienal é sempre um momento muito esperado, seja no Rio ou em São Paulo, o público aparentemente tem correspondido. Qual era a sua expectativa para Bienal do Rio deste ano?
Pedro – A Bienal do RJ é bem diferente da de SP. Como no RJ ainda há poucas livrarias espalhadas pelo estado, a Bienal atrai mais pessoas, que veem nela uma oportunidade para adquirir livros de todos os temas. E, neste ano, os acordos feitos com os governos municipais e estadual deram um incremento nas vendas. Esta foi a minha 26ª e ainda me sinto estreando. Foi a 1ª da Faro com estande grande, independente. Eu estava ansioso, mas também apreensivo. Levantar um estande de mais de 100 metros, colocar uma equipe para trabalhar tantos dias, autores vindos de algumas partes do país não é simples. Há um peso grande para a face empresário e ao mesmo tempo manter a atividade principal da editora que está no outro estado: será que vamos conseguir cobrir os custos? Então era um misto de ansiedade alegre e alguma tensão mas, o resultado foi incrível.
Evan – Agora, passada a bienal é hora de avaliar o caminho adiante. Qual o seu sentimento sobre o que nos reserva o mercado editorial para curto e médio-prazo? Podemos ficar otimistas? Acha que a mentalidade do brasileiro tem mudado para ser um maior consumidor de livros?
Pedro – Na Bienal de SP de 2018 tivemos a mesma resposta. Trata-se de um evento jovem, para atrair novos leitores, encantar novas plateias. As Bienais do RJ e de SP entenderam bem isso. Os jovens de hoje são mais leitores que os da minha geração e esse movimento começou 20 anos atrás, com Harry Potter. E melhor, não parou. Outros autores tem formados novos leitores e os eventos só têm confirmado isso.
Evan – Talvez o incidente de maior repercussão durante esta bienal tenha sido a tentativa de censura de materiais com temática LGBT, por parte da prefeitura do Rio de Janeiro. Conte-nos como isso aconteceu e como essa notícia foi recebida por você.
Pedro – Foi meio insano. Eu me mudei para um apartamento no RJ durante os dias da Bienal. À noite soube do Twitter do Crivella. Na parte da manhã, que havia reservado para trabalhar do apartamento, minha gerente comercial mandou mensagem contando da proibição, de que todos os estandes foram orientados a tirar da exposição livros eróticos e LGBTS. Na hora eu falei por mensagem: Carol, anuncia. Ela respondeu: É para avisar aos clientes que estamos recolhendo? NÃO! Coloque os livros na ponta do estande, com a melhor exibição. Vou te mandar um cartaz para você imprimir e colocar em todas as pontas. Liguei para o meu sócio e avisei: Diego, cuide de conseguir um advogado. (Risos…) Nós rimos, mas foi tenso. Cheguei no estande, preguei os cartazes nas extremidades, com ótima visualização e avisei à equipe qual seria nossa postura. Se tentassem recolher faríamos um bloqueio humano. Não iríamos permitir. Algumas pessoas não sabem, mas minha luta LGBT vem desde os anos 90. Fui o primeiro homossexual que levou uma empresa ao tribunal por homofobia no ambiente de trabalho. Até então esses processos nunca eram levados adiante. Tenho pique para enfrentamento quando sinto meu direito desrespeitado. Publico livros LGBTs também porque acho necessário, sobretudo para os jovens, e não poderia me acovardar. Que exemplo eu daria para eles? Então, na noite de sábado, quando avisaram novamente que iriam vir ao estande para recolher, sobretudo por conta do cartaz, que havia tornado minha editora alvo central da ação eu fiz dois posts pedindo ajuda aos amigos de outras editoras que estivessem por perto, para se juntar a nós. E recebi muito carinho e força. Foi tenso mas também emocionante.
Evan – Com tanta repercussão, a literatura LGBT acabou tendo suas vendas alavancadas na bienal. Você acredita que isto se deve a um amadurecimento da mentalidade do público, principalmente o público que lê, ou há outros fatores envolvidos?
Pedro – Esses “eventos” que expõem o preconceito servem para que mais pessoas saiam da toca. Como diz a frase, não basta não ser racista, temos de ser antirracistas, o mesmo acontece para machismo, homofobia etc. Há hoje mais pessoas dispostas a enfrentar as causas que acreditam.
Evan – Independente se somos gays, héteros, power rangers ou marcianos, que mensagem você deixaria à nós, como sociedade organizada, para que não venhamos mais presenciar atos de censura ou mesmo de intolerância em um futuro próximo?
Pedro – Nessa Bienal, depois de muito tempo, vi as pessoas esquecendo suas opiniões políticas e se unindo por causas em comum. Por muito tempo tivemos muitas causas sociais sequestradas por ideologias. O que eu vivi nos últimos 30 anos me fez abandonar as ideologias partidárias, porque nelas, as causas sempre valem menos que as ideologias partidárias. Decidi que não seria mais refém. E desse fato as pessoas se juntaram. É muito louco falar disso, mas Crivella chegou até onde está com muito apoio da esquerda, então não era uma questão de ideologia política, mas de causa. A ação do Felipe Neto, por exemplo, foi sensacional. Eu não o acompanho, já tive minhas reservas, discordo de coisas que ele pensa, como discordo de coisas que até meus amigos muito próximos pensam, mas numa hora dessas o inimigo é comum: a ignorância.
Evan – A Faro, com certeza, está trabalhando em novos projetos literários para os próximos meses. Você pode nos adiantar algo?
Pedro – Eu só adianto os livros estrangeiros. Os nacionais só anuncio quando me entregam. Mas todos os autores da casa estão trabalhando para entregar novos originais entre o fim desse ano e o próximo. Teremos uns livros sobre racismo, um na linha do futurismo como Sapiens, um sobre os trabalhos de Ayn Rand, alguns sobre o Pensamento Liberal, sobre Filosofia, e um investimento maior em YA para o próximo ano.
Evan – Já ouvi você dizer algo como “Um ótimo livro pode quebrar uma editora”. Muitas coisas são levadas em consideração antes que um editor decida publicar ou não um livro. Pode nos contar o que você leva em conta para que um livro receba o selo Pedro Almeida?
Pedro – Os editores recebem indicações o tempo todo. Eu recebo cerca de 30/50 por dia. Contrato 3 no máximo por mês. Há livros ótimos que eu não publico. E o motivo? Não tem um grande público. Não tem uma abordagem que pode alcançar um público mais amplo. Basta que um editor publique mais de 50% dos seus títulos que deem prejuízo que leva o negócio à falência. E não se trata apenas de qualidade, mas de haver plataforma de leitores suficientes para cada obra. Eu procuro sempre algo que não vi antes. Eu leio todos os livros pensando em não gostar… e o livro deve me fazer pensar o contrário. E tento ler cada livro como um leitor comum, para não cair no erro de publicar para mim mesmo.
Evan – Pedro Almeida, foi um grande prazer falar contigo. Ficamos muito agradecidos e honrados por ter aceito nosso convite e fica aqui nosso desejo de sucesso cada vez maior com a Faro Editorial, com o Prêmio Jabuti e em tudo que você faz. Grande abraço da família À Espreita.
Gostou do nosso bate-papo com o grande Pedro Almeida? Deixe seu comentário e não deixe de se inscrever no blog. Abaixo deixamos os links para alguns dos lançamentos da Faro Editorial. Grande abraço à todos!